A Defensoria em tempos de recessão
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Como reflexo da crise econômica, já se verifica o aumento das ações judiciais de despejo, cobrança de créditos, pensões alimentícias e relativas a serviços de saúde.
Neste grave momento de crise econômica por que passa o Brasil, é a camada mais vulnerável da população que sofre seus mais duros efeitos — o que demanda um reforço da rede de proteção do Estado. A elevação do número de desempregados gera um drama social, a exemplo do que ocorre com os trabalhadores do Comperj, em Itaboraí.
O trabalhador demitido não conseguirá mais custear a pensão alimentícia do seu filho, pagar o financiamento do eletrodoméstico adquirido parceladamente, ficará inadimplente com o plano de saúde de baixo custo e também não quitará o débito referente à aquisição da moradia ou ao pagamento do aluguel.
Como reflexo desse quadro, já se verifica o aumento das ações judiciais de despejo, cobrança de créditos, pensões alimentícias e relativas a serviços de saúde, cabendo à Defensoria Pública a missão de defender — individual ou coletivamente — todas essas pessoas.
E esse serviço de defesa jurídica — integral e totalmente gratuita — já ocorre em todos os 92 municípios do Estado do Rio de Janeiro, pois a Defensoria fluminense é uma das poucas do Brasil que cumprem a determinação constitucional de atuar em todas as comarcas, embora, em alguns casos, em condições ainda longe de serem as adequadas.
O permanente desafio da Defensoria Pública é assegurar a todos o direito de acesso à Justiça, assim entendido não apenas como o direito de ser defendido em uma ação judicial, mas de ver na prática a garantia de seus direitos individuais e sociais. Em 2014, os defensores públicos atenderam a mais de dois milhões de pessoas e a expectativa é de um aumento de mais de 20% em 2015. A grande maioria dos casos é de causas cíveis, como família, consumidor, saúde e moradia.
Neste ano, houve uma ampliação da Central de Relacionamento com o Cidadão (129). Porém, essa melhoria no serviço não responde isoladamente pelo expressivo aumento de chamadas. Apenas para ilustrar esse crescimento, de janeiro a setembro de 2014, a Defensoria Pública recebeu 274.005 ligações em busca de orientação jurídica. Nesse mesmo período de 2015, as chamadas saltaram para 517.842. Já o número de mensagens recebidas pelo Fale Conosco passou de 7.177 para 12.494.
Outro dado diretamente ligado ao contexto econômico é o aumento de 40% nos agendamentos para o Núcleo de Família no primeiro semestre de 2015 com relação a 2014 — de 18.370 para 25.848. A estimativa é que mais de 80% desses casos sejam referentes a ações de alimentos.
Para fazer frente a essa crescente procura, a adoção de soluções extrajudiciais e coletivas é um importante caminho, a exemplo dos acordos para indenizações de vítimas de acidentes de transportes públicos — sem processos judiciais e com indenizações pagas em algumas semanas — e da atuação em defesa do direito de moradia de comunidades carentes.
Para reforçar os instrumentos de atuação da Defensoria Pública, o Supremo Tribunal Federal, em decisão recente, reconheceu de forma definitiva a constitucionalidade da lei que prevê a tarefa da Defensoria Pública de promover a defesa coletiva das pessoas.
Ao longo dos últimos dez anos, a Constituição Federal já sofreu nada menos do que quatro emendas, todas para fortalecer a Defensoria Pública e afirmar sua indispensabilidade para a defesa do Estado Democrático e dos direitos humanos, inclusive prevendo a sua autonomia, como meio para afirmar plena defesa dos direitos dos cidadãos, até mesmo contra o próprio Estado ou o poder econômico.
O momento é oportuno para uma reflexão sobre o tema da desigualdade social e econômica e dos muitos desafios para a construção de uma sociedade efetivamente justa e solidária.
Artigo publicado em o Jornal O Globo http://oglobo.globo.com/opiniao/a-defensoria-em-tempos-de-recessao-17867430
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